quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

O cachorro.

Haviam alguns dias que ele estava na cama. Ele não sabia quantos, não tinha animo para contar. Não comia. Só levantava para ir ao banheiro, ocasionalmente. Quando sentia fome, fumava um cigarro, quando era sede, tomava em grandes goles, um copo de conhaque. Não queria matar a sede, queria morrer. Graças ao seu maldito cachorro.

Ele era velho, morava sozinho há tempos e sua máquina de escrever havia quebrado por culpa de seu cão morto.

- Não bastava eu estar quase morrendo! Ele tinha que passar na minha frente, morrer antes. Cão!

Estava completamente só. Não costumava ter muita companhia, mas nenhuma era quase uma novidade em sua vida. Não sabia o que fazer além de exercer a profissão que por tantos anos, inexplicavelmente, o sustentou. Escritor.

Tentando dormir alguns dias depois do cão ter morrido, ouviu sons na sala.

- Espero que me matem, mas não façam nada com a máquina de escrever.

Um estrondo, um vidro quebrado, um xingo. Silêncio.

Ele se levantou para avariar os estragos. O relógio e o cinzeiro da mesa de centro sumiram, tudo bem. Foi até a salinha onde haviam apenas, sua máquina de escrever em uma mesinha, um banco, um cinzeiro e uma janela. A máquina estava no chão, de ponta cabeça. A mesinha virada, o banco no jardim. Colocou-a de volta em sua mesa. Olhou, faltavam algumas peças, procurando lembrou que sua visão já não ajudava no escuro e desistiu. Tentou colocar um folha, deu certo. Começou a escrever uma palavra, parecia tudo bem, bateu na barra de espaço, ela falhou.

A barra de espaço não funcionava, depois descobriu ainda que perdeu alguns dos tipos de metal. Quebrada, a máquina permaneceu na mesinha, intocada, graças ao cachorro.

- Se o cachorro estivesse vivo teria afugentado aqueles delinquentes!

O velho foi para sua cama, ia ficar lá até morrer, graças ao seu cachorro.

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